PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: MOVIMENTOS SOCIAIS, POLÍTICOS E EDUCAÇÃO POPULAR.
MÁRCIA DE CAMPOS
VIVÊNCIAS DA PARTEIRA EM ACORIZAL-MT: SABERES E EXPERIÊNCIAS NO CUIDADO COM A VIDA.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Educação, na Linha de Pesquisa Movimentos Social, Política e Educação Popular.
Março/2017
Segue abaixa alguns trechos da narrativa:
Dona de um sorriso tímido, com uma parcimônia ao falar, acolhedora, sempre pontual e disposta para os nossos encontros, Irmã Dagmar é uma das muitas mulheres guerreiras que vivem no município de Acorizal, na baixada cuiabana em Mato Grosso. E ela seria apenas mais uma se não fosse as mais de mil crianças que ela ajudou a colocar no mundo, nesses 30 anos como parteira.
Seu estilo de narrativa foi empolgante, expressava com muito entusiasmo os fatos que compõem sua história de vida e mais empolgante quando conta suas experiências como parteira.
Nascida com parteira em Minas Gerais, município de Prata, em uma família de 12 irmãos, sendo a décima filha. O pai era fazendeiro e a mãe costureira, quitandeira e grande amiga das plantas medicinais, onde tinha grande conhecimento com os remédios caseiros.
Podemos observar que Irmã Dagmar vem de uma família simples, com muitos filhos, da zona rural.
Em sua narrativa assumia um tom melancólico e se sente orgulhosa por ser filha de uma mulher que com seus saberes sobre plantas medicinais ajudou muitas pessoas no cuidado da saúde, e a considerava uma pessoa de muita sabedoria e fé.
Neste sentido, observamos o quanto a Irmã Dagmar se sente segura ao falar de sua história, que nasce de parteira, em uma família com muitos irmãos e que era católica. Ela sorrindo para mim disse.
"Minha história de vida é bonita. Nasci na fazenda com parteira, uma família grande de 12 filhos, sou a 10ª filha, sete mulheres e cinco homens. Uma família que vivia os princípios cristãos".
Irmã Dagmar relata que desejava ser enfermeira, pois ajudou sua mãe a cuidar de uma irmã que ficou doente por muito tempo e isso despertou nela este desejo. Mas o pai não permitiu, apenas autorizava que as filhas fossem professoras. Eu queria na verdade fazer enfermagem, mas o meu pai não permitia, para ele todas as filhas tinham que ser professora e eu queria fazer enfermagem.
Esta vontade nasceu porque ela tinha uma irmã doente e sempre via minha mãe cuidando dela. Lá começou a despertar para o lado da saúde, mas o pai não permitiu. "Eu estudava no colégio de irmã aí comecei a pensar em ser irmã, mas eu queria ser irmã depois de ser enfermeira só que como ele não deixou".
Assim, ainda jovem começou a estudar para ser freira, aos 19 anos, no Rio de Janeiro, na congregação Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo, mesmo contrariando seu pai, que também não queria que ela fosse freira.
"Comecei estudar em Petrópolis, no Rio, ali fiquei cinco anos, quando terminei o noviciado fiz o Técnico de Enfermagem na Escola Santa Luiza de Marillac, no RJ, uma escola muito boa. Eu fiz um curso muito bom, sobretudo porque como eu era irmã e morava no hospital tinha oportunidade de ficar trabalhando nos períodos de férias".
Relatou que mora em Mato Grosso há 40 anos, antes morava em Campo Grande, onde adquiriu muita experiência no cuidado de pessoas internadas em hospital.
"Eu queria vim morar no meio do povo, para fazer trabalho de São Vicente, próprio do Carisma – estar no meio dos pobres, eu sonhava em morar num lugar pobre, e Acorizal era município de menor renda percapta, não tinha nada; posto de saúde fechado, não tinha assistência à saúde e à educação, era muito precária. O postinho de saúde estava fechado, e cheio de ratos, barata e morcego".
Quando ela chegou a Acorizal, em 1976, se deparou com uma realidade bastante precária e logo se colocou a serviço desta comunidade.
Irmã Dagmar conta ainda que ao fazer visitas domiciliares, conheceu todos os moradores de Acorizal. O convívio no cotidiano da comunidade, ela foi criando laços de amizade e de confiança com os moradores. Afirma que tornou-se parteira por solidariedade, as outras parteiras, diante da necessidade de cuidar das mulheres da comunidade, compreende ainda essa atividade como um ofício, um dom dado por Deus.
Irmã Dagmar, apesar de muitas dificuldades encontra das no oficio de partejar, não negava cuidar das mulheres que vinham buscar seus cuidados. Sempre contou com a companhia e solidariedade da Irmã Vera.
Em seus ralados podemos observar o quanto Irmã Dagmar reconhece o saber popular das parteiras, saberes que são repassados de mães para filhas, e o quanto aprendeu nos diversos momentos de rodas de conversas e palestras que teve junto com essas mulheres.
Apesar de ainda ser chamada, para ajudar em partos, ela não exerce mais o ofício de partejar a 10 anos. Relata que sente saudades, mas também se vê impedida, diante das complicações que são impostas pelos órgãos de controle das profissões de saúde.
Irmã Dagmar e reconhecida na região de Acorizal não apenas como parteira, mas também como a irmã que cuida dos doentes. Em todos estes anos, que a Irmã Dagmar mora em Acorizal, ainda no posto de saúde ela cuidava das pessoas com homeopatia como agente da homeopatia popular, vinculada a Associação Brasileira de Homeopatia popular.
Confira o trabalho completo de Mestrado de Márcia Campos, clique aqui.